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Contemplando o mundo com coração receptivo, reconhecendo a beleza intrínseca da vida, sou transportado no cassuá das recordações, garimpo fatos do cotidiano que envolve amigos, vizinhos, parentes. Enquanto os holofotes se voltam para aqueles que transitam em tapetes vermelhos, apagam-se para os invisíveis. Estes, no entanto, são relegados ao abismo da indiferença social. Como Nelson Rodrigues disse uma vez, “Apenas os profetas enxergam o óbvio”. No entanto, eu afirmo que a percepção não requer profecia; basta uma observação aguçada para enxergar o que está claramente a um palmo do nariz.
Em 1984, uma
jovem do bairro Senhor do Bonfim, 16 anos, incrivelmente bela, estudante do
Gumersindo Bessa, cruzava a cidade indo e vindo para o colégio. Sua beleza
atraía atenção dos rapazes, que disputavam no palitinho quem iria namorá-la
primeiro. ‘Uma fruta de vez temporana’ (Alceu). Um namoro malfadado lhe causou
uma gravidez, o pai não assumiu. Ainda em fase de fetação, o relacionamento
teve fim. A gravidez fez sua vida virar de ponta-cabeça. Foi expulsa de casa
assim que o seu pai tomou conhecimento. O velho era mais grosso que dedo
destroncado.
Na década de
oitenta, da lagoa de doutor Jorge ao posto de Rubens, floresceu ali um cenário
de meretrício. Os cabarés de Cícero, de Raimundo de Jacó, de Tomatinho, de
Gildo, de Ninha; do outro lado da BR-101, a Boite Bambu, esses eram o epicentro do glamour, dos prazeres, da
perfídia, da lascívia, concupiscência; diga-se de passagem, local de mulheres
lindas, onde jovens de todas as classes afirmavam a masculinidade e de elevação
dos níveis de dopamina, na busca pelo prazer e orgasmo.
Após dar uns
amassos no brotinho, no escurinho dos cinemas Gonçalo Prado, São João e
Guarany, os jovens, derramando testosterona, se dirigiam à zona do meretrício
para aplacar o desejo sexual. Os mais abastados financeiramente frequentavam a
Boite Bambu. Este, num canto da sala, dispunha de uma vitrola que permitia
reproduzir a música do gosto do cliente, bastava comprar a ficha. Os sucessos
da época giraram no ritmo da discoteca, com destaque para Tina Charles, Boney
M, Bee Gees, Donna Summer, The Village People.
Empresários do
comércio local, políticos, maridos infiéis eram frequentadores da Boite Bambu,
se derretiam aos encantos das mulheres que acendiam seus fetiches. Elas Bebiam
uísques Natu Nobilis, Teacher's, Old Eight, Vodca, Martini, Palhinha, Passport;
fumavam cigarros das marcas Carlton, Minister, Chanceler, Hilton, os mais
caros.
Os outros
cabarés eram frequentados por operários, trabalhadores da construção civil,
empregadas domésticas e similares. Às vezes, as paixões excessivas motivavam discussões
acaloradas, culminando até em homicídios.
Aquela menina,
vamos chamá-la de Isabela, estudante cheia de sonhos, foi amparada na Boite
Bumbu, depois passou pelos outros cabarés, agora expressava um olhar triste,
acabrunhado, a vida já tinha lhe mostrado as unhas nos seus 17 anos
incompletos. Embora a prática da prostituição seja condenada pela sociedade,
mas é nítido que muitas mulheres vivenciam em seus corpos uma luta pela
liberdade e sobrevivência.
Em 07 de setembro de 2014
Genílson Máximo
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